sorry folks: u forgot tha say 'please'
voltaremos quando vos for mais inconveniente

uma nova voz

Cruzamos duas peças à vossa consideração. Uma lógica transversal as une - a nossa.


I


Ocupados de artistas que se escusam à prostituição do mercado, optando por criar obras em formatos que esse rejeita, particularmente hostis à narrativa literária, e no processo criando um outro mercado: encontramos na crónica de António Guerreiro a paródia/alegoria (*) óbvia para ilustração – textual – às nossas frentes.

* "Parábola/alegria", enfim.

Perante o estranho artefacto com o qual se depara na livraria francesa, a sua surpresa:

fiel aos estereótipos do género, universal na sua menoridade

Tudo aqui é estranho e, ao mesmo tempo, muito eloquente: uma pequena editora, edita um livro precioso e inclassificável, de um grande escritor que desdenha olimpicamente dos modelos romanescos de uma literatura homogeneizada.

A tradução portuguesa deste livro tem mais de novecentas páginas e foi feita por Manuel João Neto, um nome que não conseguimos localizar em nenhum território publicamente conhecido da coisa literária. Que louco é este que investiu um bom pedaço de vida numa tarefa gigantesca e silenciosa, condenada a uma quase clandestinidade? A pergunta não é retórica: gostava de saber quem é e presumo que é um perdulário obsessivo, de paixões fortes por certos livros e muito imprudente. Presumo que tradutor e editora se juntaram num luxuoso "gasto gratuito", uma espécie de potlach, como se diz das actividades heterológicas, como os rituais que não servem nenhuma economia da utilidade. E esta presunção encontra boas razões para se sustentar: o livro não se encontra nas livrarias onde devia ter sido distribuído, provavelmente porque tem dificuldade em caber nelas (e não é por ser um calhamaço de quase mil páginas), como muitos outros de variáveis dimensões e incerto alcance.
in "Opinião. A literatura exilada" 2 fev 2018

Ainda um sorriso interior se espreguiça, hesitante se algum sentido há-de dar à coincidência de leituras, e poucas linhas dentro do artigo do senhor que se segue temos a certeza que outros mercados em outros formatos estão na ordem do dia. Da europa central, frança e portugal, seguimos deste para a argentina.


II


Pedro Moura fala-nos de "uma 'nova voz'": "primeira experiência de fôlego da artista" Júlia Barata e "a primeira incursão neste campo criativo pela livraria-editora" Tigre de Papel, rematando da "a abertura de novos territórios na banda desenhada em Portugal":

Não sendo propriamente uma novidade em termos genéricos ou estilísticos, é-o todavia no seio da nossa própria cena, que ainda continua, apesar da sua mais recente saúde, arreigada a abordagens relativamente convencionais e expectáveis.
in "Gravidez. Júlia Barata (Tigre de Papel)" 2 fev 2018

A recordar-nos das convenções e falta delas na arte da BD, portanto. Ou, nas palavas do académico/crítico:

O facto do livro ter um formato oblongo convidaria igualmente a toda uma série de interpretações materiais-conceptuais, possibilitando ir tão longe quanto o que uma alucinação semiológica permitiria, discutindo a "verticalidade" do acto central à diegese, mas fiquemo-nos por algo mais simples.
in "Gravidez. Júlia Barata (Tigre de Papel)" 2 fev 2018

Uma pena: o céu é o limite à verticalidade das nossas alucinações interpretativas, mas simples ficou-se. Do restante texto convidamos à leitura, temos tempo para este pequeno guia, não ao seu digest! Nele encontrarão tópicos que vos serão familiares de nos seguem nos registos:

Não se esteja à espera de, por exemplo, "coerência gráfica"
  • uma gestualidade sumária e rápida herdeira de toda uma série de autores modernos
  • não está interessada propriamente em efeitos de realismo ou de ilusão
  • flutuação dos registos funciona para melhor transmitir as diferentes intensidades
  • ausênciade mecanismos de organização narrativa "mais sofisticados"
in "Gravidez. Júlia Barata (Tigre de Papel)" 2 fev 2018

…entre hits clássicos como "a utilização de várias abordagens gráficas", "construção de personagens" ou "ritmos desconjuntado de percursos temporal e experiencial". Não comentamos, fica a referência. A quererem conclusões da peça ou nossa, palavras dele:

O problema está em navegar por entre esse excesso, as escolhas a fazer mas, sobretudo, apercebermo-nos de quais juízos de valor emergem nessa navegação e quando aceitar ou rejeitar esses mesmos juízos.
in "Gravidez. Júlia Barata (Tigre de Papel)" 2 fev 2018

Ou, da nossa súmula:

"a banda desenhada continua a ser uma subtração das suas partes."


III


Outras vozes. Continuamos a blindar o site contra os curiosos ocasionais: todos os goodies estão cada vez mais enterrados e a sua sequência baralhada, obviamente, ainda em tópico com formatos e narrativas. Para chegar ao sentido da obra têm que batalhar contra toda a literatura que a cobre - ou recebes o link directamente na newsletter, sabemos que punk - e cómico -não lê.

E de easter eggs escondidos, já alguém quer arriscar o que fizemos no último "…Previously" ? Uma pista:

Sendo a única cena que foge totalmente à câmara dos eventos do resto do livro, torna-se significativa.
in "Gravidez. Júlia Barata (Tigre de Papel)" 2 fev 2018

Ó, aquilo das ironias.

velha nova história