sorry folks: u forgot tha say 'please'
voltaremos quando vos for mais inconveniente

à ascensão da nova ignorância

A substituir à velha ignorância. Novo ano, treta antiga: o Pacheco erra a jusante mas acerta no resto, e como exercício de memória futura escolhemos terminar o ano com esta nota. Onde acerta: no que chamamos "o fim da inocência" - cuja realização e alcance se transformará em algo de diferente na geração que se segue dependendo dos exemplos de resistência que consigamos legar. A desconfiança entre certos grupos sempre foi forte -temos mesmo uma dificuldade imensa em conseguir convencer os punx a encenar a mesma guerrilha nestes domínios- mas o feliz momento de desgraças que vivemos conseguiu -para já- quebrar o deslumbramento, e até entre os nossos espécimes de laboratório se nota a evolução:

The triumph of the small

Sometime around 2007, we changed (...), the digital possible moved from our desktops to our hands. Meantime, sometime between then and now, people returned to craft. Amid some uncertainty out in the world, people returned to making. Retreating into handmade objects, slow processes, face-to-face friendships and pleasures, people demonstrated that while we can’t change the world through artisanal coffee, we can reinforce the human values that seemed unrequited through rectangular glass.
in "The triumph of the small" 12 dez 2016

E os nossos indie-punx-artsys para todo o sempre ficaram aqui, os poucos que daqui sairam ainda estão deslumbrados com o que se seguiu.

Sometime around 2016, we changed again. Or rather, we began a media evolution that would continue for years to come. Public blurred with private. Truth blurred with fiction. Celebrity blurred with identity. Purpose blurred with perception.
in "The triumph of the small" 12 dez 2016

E para onde vamos agora:

We will change again. The new year will bring a different kind of retreat. Rather than retreating into making or craft, we will retreat into smaller and more nuanced connections. Into quality over quantity. Into the single story over collections of stories. Into the subtle over the general. Into the singular datapoint over big data. Into attention over distraction. 2017 will ring triumphs for the small and true, the richness of a single moment, and a celebration of what is, rather than what is not.
in "The triumph of the small" 12 dez 2016

Local, proximidade, comunidade, open web distribuída e descentralizada. Familiar? Voltaremos aqui nas nossas teses, e, a propósito delas, lembram-se onde ficámos? Autenticidade. Antes, e para a tal nota de arquivo do estado da arte em passagem de testemunho entre anos, o reforçar do sentimento de backlash à tecnologia. Outro exemplo:

The year of digital detoxing

As news organizations, we have to reclaim our identities and be more than just “content-creators” that fill feeds. It’s time to rethink our coverage and look deeply at what we stand for. We have to provide insights that last beyond a click or a tweet (...) We have to remember the people we create content for and that they are real personalities with opinions and experiences that we will never know. We have to build communities online and offline that speak to the mission of why we do what we do. We have to give people a reason to come back from their digital detoxing.
in "The year of digital detoxing" 12 dez 2016

Se estes exemplos são demasiado press-centric para o teu gosto, generalizemos:

2016: The Year We Stopped Listening To Big Tech’s Favorite Excuse

In 2016, more than any year before it, our world was shaped by the internet. (...) This year, the internet and its attendant controversies and intractable problems weren’t just a sideshow, but a direct reflection of who we are, and so the decisions made by the companies and platforms that rank among the web’s most prominent businesses became harder to ignore.

Big Tech’s well-practiced excuse became less effective. The idea that their enormous and deeply influential platforms are merely a morally and politically neutral piece of the internet’s infrastructure — much like an ISP or a set of phone lines — that should remain open, free, and unmediated simply no longer makes ethical or logical sense. (...) The unspoken corollary to this argument seems to be “Hey, we’re just a platform, we’re not responsible, nor could we ever be liable for the design choices that guide and enable our users.” But as we saw this year, that couldn’t be further from the truth. Facebook’s not just the place where you go to play Farmville and like pictures of your friend’s babies — it’s a filter-bubbled window through which more than a billion people view the world. Twitter isn’t a global town square or park, it’s the world’s most important newswire and, for some, a wildly effective way to quickly communicate with a massive audience.

For years, Silicon Valley’s biggest companies have been telling us they plan to reshape our lives online and off. But 2016 was the year that we really started taking those claims seriously.
in "2016: The Year We Stopped Listening To Big Tech’s Favorite Excuse" 30 dez 2016

Pacheco em sintonia:

Ainda há-de alguém convencer-me que este comportamento lá por usar tecnologias modernas representa uma vantagem e não uma patologia. Faz parte de sociedades em que deixou de haver silêncio, tempo para pensar, curiosidade de olhar para fora, gosto por actividades lentas como ler, ou ver com olhos de ver. E se olharmos para os produtos de tanta página de Facebook, de tanta mensagem, de tanto comentário não editado, de tanta “opinião” sobre tudo e todos, escritas num português macarrónico e cheio de erros, encontramos fenómenos de acantonamento, de tribalização, de radicalização, de cobardia anónima, de ajustes de contas, de bullying num mundo que tem de ser sempre excitado, assertivo e taxativo.
in Público 31 dez 2016

Podiam mesmo acabar as frases uns dos outros:

Não é por acaso que o grande reservatório do populismo político e social nas sociedades ocidentais são as redes sociais, que, não sendo a causa do populismo, são um seu grande factor de crescimento e consolidação.
in Público 31 dez 2016

Where emergent, swarming online hate groups (including but not limited to the so-called alt-right) developed a loud counterculture to combat liberalism.
in "2016: The Year We Stopped Listening To Big Tech’s Favorite Excuse" 30 dez 2016

Mas Pacheco borregou nas conclusões porque parte dos pressupostos errados. À restante leitura e compreensão de sentido é talvez importante recordar que, apesar da aproximação deste autor às nossas posições - e que algumas vezes já aqui registamos a nossa perplexidade-, no comboio dos modelos sociais este senhor apeia-se umas paragens antes de chegarmos ao destino. Insinua-se de início mas imediatamente o encontras front-and-center:

Parece que falar da ignorância coloca logo quem o faz numa situação de arrogância intelectual
in Público 31 dez 2016

Não é automático, é só quando no seguimento do mesmo acrescentam:

Acompanha outro tipo de fenómenos como o populismo
in Público 31 dez 2016

É aí que a arrogância reside. Porque é possível concordar com os seus efeitos nefastos e activamente os querer combater -vide OS POSITIVOS aos teens no desmascarar do status quo-

A ignorância é uma forma de pobreza e o seu crescimento acentua a pobreza em geral e, mais do que a pobreza, a exclusão e a diferenciação social. É até um dos mecanismos mais eficazes para aumentar a distância entre pobres e ricos, e para estabilizar um statu quo nos pobres
in Público 31 dez 2016

- e estar em perfeita sintonia com os sintomas que o autor aponta -vide as nossas teses-

Mesmo que tenhamos, como agora se diz, as gerações mais qualificadas, estamos cegos quanto ao crescimento da nova ignorância (...) A antiga ignorância assentava numa carência, numa falta, a nova assenta numa ilusão.
in Público 31 dez 2016

- e, no entanto, estarmos nos antípodas das suas soluções. Enter elitismo:

...desde a treta do “jornalismo dos cidadãos” até à divulgação não mediada de tweets e comentários - acompanha um dos aspectos mais agressivos desta nova ignorância: o ataque ao saber, ao conhecimento certificado, em nome de um igualitarismo da ignorância.
in Público 31 dez 2016

Vide gatekeepers. Não defendemos pouco mais ou menos a actual qualidade do jornalismo dos cidadãos e seus comentários, se vos exaltamos a olhar para o digital é porque não o podemos evitar, mas, ao contrário da habitual treta que sustenta o discurso elitista, olhamos para lá do que há como o é e cremos no que será, cremos na emancipação do individuo, na sua capacidade e liberdade, sem o paternalismo de quem sabe melhor.

Pacheco no seu melhor e pior, e porque vale a pena registar o discurso para que te habitues ao mesmo e lhe ganhes anti-corpos, que te treines a separar entre a observação do que é, e a suposição do que tem que ser:

O facto de poderem escrever potencialmente para todos não significa que as suas “opiniões” — tanto mais quando pretendem ter um estatuto de idêntica qualidade ao de quem conhece as matérias sobre as quais opina, ou tem uma criatividade evidente — têm um efeito de rasoira por baixo, que se reproduzem sem qualquer verificação. Se acrescentarmos que muitos consumidores das redes sociais obtêm aí quase toda a sua informação, percebe-se os efeitos devastadores no debate público e como servem para a indústria das notícias falsas e para alicerçarem o populismo com boatos, afirmações infundadas, presunções, invenções. Como, na nova ignorância, se trata de uma atitude hostil ao saber e ao seu esforço, mais do que um efeito de fonte única, há uma guetização da opinião, com arregimentação entre os próximos e a diabolização dos “outros”. Ler só aquilo com que concordamos pode ser satisfatório psicologicamente, mas destrói o debate público fundamental numa sociedade democrática.
in Público 31 dez 2016

Tão certo, e tão errado, tão próximos e tão longe. Devolvemos ao Pacheco as suas próprias palavras, que as deverá entender num contexto que sabemos que tem as leituras para o compreender. Sem elitismos, em simplicidade:

Uso aqui uma noção utilitária de ignorância que pode ser simplista, mas que serve. Ser ignorante é não ter os instrumentos para se mover no mundo que nos rodeia, ser sujeito mais do que ser actor, não conseguir atingir o empowerment que é suposto se poder ter para se actuar conforme as circunstâncias, de modo a crescer, ser capaz, viver uma vida qualificada e tirar dela uma experiência enriquecedora, controlando-se a si próprio tanto quanto é possível, e não menosprezando as condições para se ser feliz.
in Público 31 dez 2016

Não é apenas o luddite em nós a falar, e não escondemos o primitivista que somos -

- e a nova é vista como um “progresso”, ou como uma tendência contra a qual é inútil lutar (...) em particular aquelas que têm imediatos efeitos sociais como os telemóveis, as redes sociais, e certos modos de usar os videojogos, a realidade virtual e mesmo o computador e a televisão
in Público 31 dez 2016

Abraçamos esta luta sabendo que é um "progresso" ao qual resistimos, fazendo-o exaltando outros a apropriarem-se da tecnologia, tal como antes dos telemóveis e das realidades virtuais também resistíamos a outros efeitos sociais de uma sociedade para a qual uma vasta maioria ainda vive em deslumbramento, Pacheco incluído.

Bom ano novo, ao fim da inocência, punx.

Journalism is community

Community is built in journalism’s DNA. When we talk about developing business models and audiences, what we’re really talking about is building community. (...) So how do we get out of the disastrous state that journalism is in? (...) What do we do? We return to our community.
in "Journalism is community" 14 dez 2016

♪ Since we gonna take the blame, I'mma rep my name to get my aim right
♪ Let's have an overthrow and after party in the same night
♪ And you will learn a lesson repeated through history
♪ That no matter what you think, occupation is not victory

não costas?